quinta-feira, 29 de julho de 2010

25 de Julho Dia da Mulher Negra Afro-latino-americana e caribenha

No último domingo, 25 de julho celebrou-se o Dia da Mulher Afro-latino- americana e Caribenha. O poema a seguir fala um pouco da trajetória dessas mulheres sempre presentes na caminhada para a superação das dificuldades.

NEGRA

Para Gizelda

Sou mulher

Sou Negra.

Escura como a noite.

Escura como o Nilo, jorrando ondas de negralma.

Fui escrava.

Como mucama limpei o caminho dos meus senhores.

Fui corpo, sangue, orifício para o prazer do outro.

Fui operária, doméstica, lavadeira...

Negrimaculei a alvazia sociedade.

Costurei o rasgo da invisibilidade.

Subi o morro:

Favela de São Jorge.

Lá no alto, fui pássaro... Cantei.

Da África para o mundo

Mostrei minha voz humilhada,

porém, no ritmo do tambor,

forte.

Fui vítima

da minha cor, do meu sexo.

Muitas portas fechadas.

Fui guerreira e acordei

No meio da noite... tiroteios

São Jorge havia liberado o dragão.

Cuspes de fogo tentaram queimar meus sonhos.

Resisti...

Sou mulher

Sou Negra

Sou pobre

Sou história.

Escura como a noite.

Escura como o Nilo, jorrando ondas de

negralma.


Serafina Machado

(in Cadernos Negros 29)

quinta-feira, 22 de julho de 2010

Uma velha história - por Alessandra Terribili

Nos anos 80, a luta contra a violência contribuiu para fortalecer e consolidar o feminismo no Brasil. As mortes de Ângela Diniz (1979) e de Eliane de Gramond (1981) por seus ex-maridos chocaram o Brasil. Eram mulheres que puseram fim a seus casamentos, e, além da brutalidade dos assassinatos, os dois casos envolviam pessoas conhecidas da opinião pública, o que lhes conferiu ainda mais “notoriedade”. "Quem ama não mata" era a resposta dada pelas feministas àqueles que sugeriam que os homens matavam “por amor”.

Mas não tardou a tentativa de transformar as vítimas em rés, “compreendendo” o criminoso, que teria “perdido a cabeça” por ação delas. Organizadas, as mulheres repudiaram o machismo que levou Ângela e Eliane à morte, e que, depois, buscou incessantemente justificar essas mortes com base na conduta das vítimas. A tal defesa da honra era reivindicada. O movimento de mulheres não se calou e colocou em questão as insígnias do "em briga de marido e mulher, ninguém mete a colher" ou a ideia de que "um tapinha não doi".

O tempo passou e, em 2000, a própria mídia foi pano de fundo para um crime análogo. A jornalista Sandra Gomide foi morta pelo ex-namorado, Pimenta Neves, então diretor de redação de O Estado de São Paulo. O assassinato aconteceu precisamente porque o namoro acabou. Por conta disso, ela sofreu agressões físicas e verbais, perdeu seu emprego, foi perseguida. Neves chegou a ameaçar de retaliações qualquer pessoa que oferecesse trabalho a Sandra. Pela mídia, a moça chegou a ser tratada como "aquela que namorou com o chefe para subir na vida".

Em 2008, outro episódio de violência contra mulher gerou comoção nacional. Eloá Pimentel, com seus 15 anos, praticamente foi assassinada ao vivo e em rede nacional pelo ex-namorado, que a sequestrou e a manteve em cativeiro por cinco dias. A agonia da menina foi acompanhada em tempo real, e ao se tornar a personagem central de uma história dramática, ela, como as já citadas, teve sua vida exposta e sua conduta julgada, apresentada como principal fundamento do comportamento agressivo de seu assassino.

Há poucos meses, a vítima foi Maria Islaine, cabelereira, morta pelo ex-marido diante de câmeras que ela mesma mandou instalar no salão onde trabalhava, julgando que essa atitude a protegeria da violência anunciada. Dias atrás, tivemos a infelicidade de testemunhar o advogado do assassino defendendo seu cliente com o bom e velho “ela provocou”.

Eliza e Mércia

Agora, a mídia tem apresentado as histórias de Eliza Samudio e de Mércia Nakashima como se fossem romances policiais. Convida-nos a acompanhar cada momento, provoca comoção, sugere respostas, vasculha a vida das mulheres mortas e as expõe a julgamento público, sem direito de defesa. A tragédia é exaustivamente explorada, e no final, a lição que fica é: elas procuraram.

Mércia morreu, aparentemente, porque rejeitou seu ex-namorado. Cometeu o desaconselhável equívoco de querer sua vida para si mesma, de não aceitar perseguições, sanções ou intimidações. Entretanto, tem-se falado em traição e ciúmes. E lá vem, de novo, a conversa fiada da defesa da honra. Mas é Mércia quem não está mais aqui para defender a sua.

De Eliza, disse-se de tudo: maria-chuteira, garota de programa, abusada, oportunista. Acontece que não importa. Não importa se ela foi garota de programa, se era advogada, modelo, atriz, estudante ou deputada. Ela está morta. E morreu, aparentemente, porque o pai de seu filho não queria arcar com as obrigações legais e éticas de tê-la engravidado.

Ela nunca vai poder se defender das acusações póstumas. Não vai ao “Superpop” defender sua versão ou sua história. Não vai estampar a capa de “Contigo”, acompanhada de frases de impacto entre aspas. Ela está morta, e o que ela fez ou deixou de fazer, pouco importa agora. E seria prudente, inclusive, evitar julgá-la pelo crime que a matou.

Mais uma vez, a história se repete. Mulheres são mortas por homens com quem se envolveram. Assassinos frios, esses homens tiraram a vida de mulheres confiando na impunidade, porque há quem os “compreenda”. A morte de Eliza e de Mércia parece ter sido calculada e premeditada. E mesmo assim, segue ecoando a ideia de que a culpa é delas, que elas procuraram, que elas provocaram.

O espetáculo da morte

Infelizmente, histórias como as de Eliza, Mércia, Eloá, Maria, Sandra, Ângela e Eliane são muito mais comuns do que se imagina. E antes de culminar em assassinato, outras formas de violência foram praticadas contra cada uma delas, como acontece com muitas – as que morrem e as que se salvam.

A espetacularização promovida pela mídia, no entanto, faz parecer que são histórias ímpares e distantes do cotidiano da vida real. Como se o perigo não morasse ao lado, como se muitas não dormissem com o inimigo. Na sua família, na sua vizinhança, no seu local de trabalho, no seu círculo de amigos, certamente há casos de violência contra mulheres, e certamente você ouviu falar de pelo menos um deles. Em recente levantamento, a ONG Centro pelo Direito à Moradia contra Despejos apontou que uma mulher é agredida a cada 15 segundos no Brasil, e uma em cada quatro afirma já ter sofrido violência. Há que se considerar também que existem as que não afirmam – por medo ou vergonha.

Essas mulheres não são co-autoras de seu assassinato. É recorrente a trama montada para torná-las rés, para justificar suas mortes nas ações delas mesmas, para tolerar a violência. “Que sirvam de exemplo”, parece que dizem.

Num mundo em que a desigualdade entre mulheres e homens se expressa visivelmente desde na divisão das tarefas domésticas até no controle dos corpos delas pela Igreja ou pelo Estado, passando pela realidade de violência e pela discriminação no mercado de trabalho ou por serem tratadas como objetos descartáveis na rua e na TV; ninguém pode dizer que não sabia; nem fazer piadinhas que celebram os casos. São mulheres de carne e osso, não são personagens de novela.

São cúmplices dessa violência todos os que a toleram ou que buscam subterfúgios no comportamento da vítima para declará-la culpada por sua própria morte. São cúmplices silenciosos, igualmente, aqueles que fingem que machismo, discriminação e opressão são peças de ficção.

Alessandra Terribili foi diretora de mulheres da UNE na gestão de 2003/2005 e Militante da Marcha Mundial das Mulheres

Fonte: http://terribili.blogspot.com/2010/07/uma-velha-historia.html

terça-feira, 20 de julho de 2010

A violência cotidiana - por Maria Elisa Horn Iwaya

O Brasil é um país machista, que construiu sua democracia calcada na divisão desigual de poder(es) entre homens e mulheres. No momento em que se estabelece essa “divisão” da sociedade, criam-se hierarquias, que suportam o mito da eterna “inferioridade” da mulher. Nesta lógica, se a mulher é mais “fraca, frágil e menos inteligente” que os homens, o uso da violência torna-se quase “natural”. Não vivemos uma realidade isolada, e com a publicação de pesquisas sobre a violência, de vez em quando nos damos conta da gravidade e parecemos escandalizados, duvidando dos números, achando-os irreais. “Dez mulheres são mortas por dia no Brasil” ¹, “Setenta por cento dos assassinatos de mulheres são praticados por seus parceiros masculinos”²:
[...] Nos Estados Unidos, uma mulher é espancada por seu marido ou parceiro a cada 15 segundos em média, enquanto uma é estuprada a cada 90 segundos. E na Inglaterra, duas mulheres por semana são mortas por seus parceiros. Na França, 25 mil mulheres são violentadas a cada ano. De acordo com a Anistia, o número de vítimas reais de abuso deve ser muito maior, devido ao estigma que inibe denúncias. Todos os anos, dois milhões de meninas entre 5 e 15 anos são obrigadas a se prostituir. O tráfico de mulheres movimenta atualmente US$ 7 bilhões por ano, segundo a Anistia Internacional.
Mas os números não mostram as pessoas. Os números são os números, e servem para nos sensibilizar, em um momento em que estamos tão incapazes de nos comover com a violência, em que esta está tão “naturalizada” que só a colocamos em questão quando ela se apresenta em nossa frente, dentro das casas, no colégio, no noticiário, atrapalhando o almoço das famílias e o comentário esportivo pretensamente “engraçadinho”. Nos últimos dias casos de violência tem ganhado espaço na mídia. O futebol, além da notícia da derrota da Seleção na Copa, traz sobre a manchete “Caso Bruno”, um exemplo desta violação cotidiana.
Questiona-se, em primeiro lugar, por que alguns setores da imprensa insistem em dar o nome do jogador à investigação. O, oras, acaso é ele a vítima? Esconder o nome das pessoas também é uma forma de “desumanizá-las”. Em um primeiro momento, tratava-se da questão como se a vítima, Eliza, fosse uma “mulher fácil”, portanto quase “culpada” pela violência que sofreu repetidas vezes. Tendo feito boletim de ocorrência, perícias, exames de gravidez, foi à imprensa para dizer que estava sendo ameaçada e, sem explicações, está desaparecida há quatro semanas. A polícia procura seu corpo, a família já não tem esperanças de encontrá-la com vida e sobre o jogador, principal suspeito do crime? Este ainda nem foi convocado pela polícia a depor.
Outro caso de violência, ainda mais grave por se tratar de uma menor de idade, ocorreu em Florianópolis, onde uma menina de 13 anos foi estuprada por colegas da mesma idade, estudantes de um colégio particular da capital. Este crime teria sido “abafado”, e só começa a ser revelado agora, pois os agressores envolvidos fazem parte de famílias influentes da cidade. Este crime foi noticiado nas redes sociais antes da mídia televisiva e impressa se manifestar a respeito. O nome da estudante e dos agressores corre em sigilo. Um dos agressores teria inclusive se “vangloriado” do feito em sua página de relacionamento na internet.
Alexandre Thomé Ivo Rojão ganhou os noticiários do país em um domingo de jogo, em que torcia com um grupo de amigos. 14 anos, homossexual, foi torturado e morto por estrangulamento. A polícia não tem dúvidas da motivação do crime: homofobia.
Estes casos encaminham-se, aparentemente, para um desfecho sem investigação nem punição de culpados, o que reforça a sensação de impunidade deste tipo de crime e estimula os agressores a continuarem a agir livremente, dando a impressão de que algumas pessoas estão “fora” do alcance das leis. Nos discursos sobre este tipo de violência, ainda coloca-se a culpa na mulher, como se esta fosse “co-responsável” pelo ocorrido, sendo “fácil” ou “promíscua” e “aproveitadora”, quase tendo provocado a agressão.
Cabe a nós, mulheres e homens que defendemos outro modelo de sociedade, livre da exploração de classe, “do homem pelo homem”, onde as pessoas não são objetos, onde os corpos não estão à venda para consumo rápido, não aceitar a violência sob nenhuma hipótese e combatê-la. Saber ler além da mídia, perceber na luta pela eqüidade de gênero um fator fundamental para a construção de uma nova sociedade, construir uma plataforma de governo avançada, que pense políticas públicas contra a homofobia, o machismo e o racismo são obrigações de todas as pessoas e precisam se concretizar em ação, neste momento histórico, em que temos a real possibilidade de elegermos a primeira mulher presidenta do Brasil.
1 Fonte: http://noticias.r7.com/brasil/noticias/dez-mulheres-sao-mortas-por-dia-no-pais-diz-estudo-20100704.html acesso em julho/2010.
2 Fonte: http://copodeleite.rits.org.br/apc-aa-patriciagalvao/home/noticias.shtml?x=62 acesso em julho/2010

Maria Elisa Horn Iwaya é estudante de história e diretora do DCE UNIVILLE.


Fonte: site da UNE

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Dados sobre a realidade do aborto no Brasil

A Pesquisa Nacional de Aborto (PNA), apresentada em maio de 2010, mostrou que 1 em cada 7 mulheres de até 40 anos já realizou aborto; se consideradas apenas as mulheres de 35 a 49 anos, esta relação cai para 1 em cada 5 mulheres. Esta pesquisa foi conduzida por pesquisadores da Universidade de Brasília e pelo instituto de pesquisa Anis – Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero e abriu a pauta da mídia brasileira na divulgação de mais dados sobre outras pesquisas e estudos nacionais sobre o tema. No dia 1º de julho, Ipas participou do Seminário Direitos Reprodutivos e Experiências junto ao Ministério Público, organizado pela Cunhã Coletivo Feminista, na ocasião foi feito o lançamento do dossiê "Impactos da ilegalidade do abortamento na saúde das mulheres e nos serviços de saúde da Paraíba". Já no dia 28 de junho, na Universidade de Brasília foram apresentados os resultados de estudos realizados em 5 estados brasileiros:
• Mulheres negras morrem muito mais em consequência de abortos inseguros, quando analisada a variável raça/cor;
• Mulheres que tiveram complicações por aborto estão entre as pacientes mais negligenciadas quanto aos cuidados de promoção da saúde reprodutiva e não são encaminhadas a serviços e profissionais capacitados;
• Há predominância de mulheres jovens, entre 20 e 29 anos, nos diagnósticos de aborto espontâneo e aborto por razões médicas;
• Nos cinco estados, a intervenção mais utilizada para assistir mulheres que abortaram é a Curetagem Pós-aborto (CPA), procedimento mais caro e que oferece riscos que estão relacionados a perfuração uterina e maior tempo de permanência nos hospitais para reverter infecções com antibióticos; na contramão da indicação do Ministério da Saúde de utilizar a Aspiração Manual Intra-uterina (AMIU);
• Em Salvador (BA) e Petrolina (PE), o aborto inseguro foi a primeira causa de morte materna.

Além das ONGs Grupo Curumim e Ipas Brasil, a elaboração dos dossiês contou com a parceria de diversas organizações, como Cfemea, Jornadas pelo Direito ao Aborto Legal e Seguro, Rede Feminista de Saúde, Articulação de Mulheres Brasileiras, Frente Nacional pelo Fim da Criminalização das Mulheres e pela Legalização do Aborto, Cunhã Coletivo Feminista, IMAIS-BA, Coletivo de Jovens Feministas de Pernambuco, Rede Mulheres em Articulação da Paraíba e Articulação de Mulheres do Mato Grosso do Sul.
Outro fato que chamou a atenção foi que, em meados do mês de maio, a Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados aprovou o projeto de lei conhecido como Estatuto do Nascituro. O projeto versa sobre os seres humanos não nascidos, ou embriões (chamados de nascituros) concebidos antes de sua implantação no útero ou, na fertilização in vitro, antes da sua transferência para o útero, conferindo-lhes a mesma proteção jurídica dos seres humanos. Na prática este projeto pode ter efeitos perversos para a saúde e a vida das mulheres, uma vez que pode inviabilizar o acesso ao aborto nos casos previstos em lei, e agravar as barreiras e desigualdades de gênero no acesso a saúde para tratamento das complicações de aborto. O projeto confere direito absoluto a vida aos embriões em detrimento dos direitos das mulheres. Notas contra o Estatuto do Nascituro foram emitidas por diversas organizações e divulgadas em todo o país, e internacionalmente, como por exemplo: Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (CNDM), Central Única dos Trabalhadores (CUT), Human Rights Watch (HRW) e Center for Reproductive Rights (CRR).
Em contra-partida, a Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 54 (ADPF n. 54) de autoria da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS) que propõe a legalização da interrupção da gravidez nos casos de ANENCEFALIA está em tramite no Superior Tribunal Federal (STF) desde 2004. Não há previsão de data para julgamento. Com o objetivo de ampliarmos as discussões, apresentamos um resumo do SEMINÁRIO SOBRE ANENCEFALIA realizado em Brasília no dia 27 de maio de 2010.

Para refletir sobre mulheres que têm de mergulhar em si mesmas e nos contatos com as pessoas que amam, buscando, equilíbrio, alegria e força para resistir às discriminações de que são vítimas. Convidamos a todos para prestigiarem a exposição fotográfica “Mulheres entre luzes e sombras”, de João Roberto Ripper, amplamente reconhecido como um dos melhores fotógrafos brasileiros que trabalha com temas sociais. A mostra esteve antes no Congresso Nacional, em homenagem ao mês da mulher. A exposição enfoca mulheres ameaçadas em seus direitos e estará no Espaço Cultural Cedim Heloneida Studart, no Rio de Janeiro, até o dia 21 de julho, das 10h às 19h.
Muito obrigada
Leila Adesse
IPAS BRASIL

Fonte e Edição completa – Jun. /Jul. 2010 - http://www.ipas.org.br/revista/ju10.html

terça-feira, 13 de julho de 2010

Especial Eleições 2010: mais políticas para as mulheres e mais mulheres na política Campanha nacional estimula a reflexão e o debate sobre a presença

O voto das mulheres faz bastante diferença nas eleições brasileiras. Atualmente, (segundo o TSE) elas representam 52% dos eleitores brasileiros (69.473.795 votantes), contra 48% de homens (64.456.332 votos). Por outro lado, apesar de serem mais da metade da população e de disporem de cotas que beneficiam a classe nas eleições, o mesmo não acontece com as candidaturas.
Para mudar essa realidade, volta às ruas a campanha “Mais mulheres no poder. Eu assumo este compromisso”. Lançada em 2008, ela defende que nas eleições a sociedade brasileira poderá ampliar o número mulheres eleitas, transformando o quadro de desigualdade que predomina nos âmbitos legislativos e executivos estaduais, distrital e federal.
Com apoio da Secretaria Especial de Políticas Públicas para as Mulheres (SEPM), o Fórum Nacional de Instâncias de Mulheres de Partidos Políticos e o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher divulgam nova edição da Plataforma pela Igualdade de gênero, racial e étnica. O documento é baseado nos compromissos firmados no 2º Plano Nacional de Políticas para as Mulheres e traz sugestões de políticas para as mulheres a serem assumidas por candidatas e candidatos de todos os partidos políticos. O fórum multipartidário é formado por representantes de instâncias de mulheres de 16 legendas: DEM, PCB, PCdoB, PDT, PHS, PMDB, PP, PPS, PR, PRB, PSB, PSDB, PT, PTB, PTN e PV.

Números
O balanço de registros em 2008 divulgado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) mostra que a participação feminina na disputa por cargos eletivos é bem abaixo do percentual masculino. De um total de 375.655 registros de candidaturas para cargos nas prefeituras dos municípios brasileiros (prefeito, vice-prefeito e vereadores), apenas 74.837 (20,96%) eram de mulheres.
As mulheres não chegam a 20% nos cargos de maior nível hierárquico no parlamento, nos governos municipais e estaduais, nas secretarias do primeiro escalão do poder executivo, no judiciário, nos sindicatos e nas reitorias. O quadro de ‘subrepresentação’ é ainda mais grave se olharmos o número de mulheres negras e indígenas – sejam eleitas ou candidatas.
Empoderamento feminino
Apenas as empresas já conseguem alcançar o percentual de 20% de chefes do sexo feminino. Uma cultura de divisão sexual do trabalho, preconceito e subalternidade ainda dificulta a autonomia e presença feminina nas decisões cruciais à vida da comunidade.
A diretora de Mulheres da UNE, Fabíola Paulino, compartilha dessa opinião e ressalta que ao invés de tratar o tema como “mulher no poder”, seria mais adequado dizer “mulher nos espaços de decisão”. Em entrevista para o EstudanteNet, ela afirmou que o período eleitoral é um bom momento para se refletir o porquê elas têm tanta dificuldade de candidatarem. “É preciso debater a participação da mulher na sociedade ontem e hoje”, disse, citando a herança de submissão a das mulheres.
A condição desfavorável em que se encontram as brasileiras é avaliada também pela deputada federal Luiza Erundina (PSB-SP). “É preciso promover a formação e a capacitação política das mulheres e propiciar-lhes condições objetivas para que possam disputar em igualdade de condições com os homens os espaços de poder”. Cotas referentes aos recursos do Fundo Partidário e ao tempo gratuito de rádio e televisão dos partidos destinados às mulheres colaborariam no sentido de equilibrar os espaços, opinou Erundina ao conversar com o EstudanteNet.
Fabíola também entende que, além das cotas de gênero, é importante a garantia de financiamento das candidaturas femininas. E não se trata de votar na “mulher simplesmente porque é mulher. Elas é que deverão conduzir o processo de transformação da sociedade, e têm que estar comprometidas com políticas emancipatórias”, defende.
Luiza Erundina, na vida pública desde a década de 1980, ressalta que a sociedade brasileira certamente só tem a ganhar com a inclusão feminina na política. “A sociedade passaria a contar com a participação das mulheres nas decisões e na busca de soluções para os graves problemas do país, além de contribuir para elevar o nível de democracia e de civilização no Brasil", explica.
Ao lamentar a representatividade das mulheres no Parlamento, que tanto na Câmara quanto no Senado não chega a 10%, a deputada federal Elcione Barbalho (PMDB-PA), bastante ativa no núcleo de mulheres do partido, é categórica: “aumentar a participação da mulher nos espaços de decisão permite que ela atue com protagonismo na implementação de políticas que garantam mudanças sociais referentes à questão de gênero", declara.
No ar desde 2008, o site traz mais detalhes da campanha, além de estudos e notícias sobre o tema. Visite: www.maismulheresnopoderbrasil.com.br.

Fonte: site UNE - Sandra Cruz
EstudanteNet estréia especial "Eleições 2010"

sexta-feira, 9 de julho de 2010

Nota de Repúdio

A União Nacional dos Estudantes vem a público repudiar a charge do cartunista Nani reproduzida no blog do jornalista Josias de Souza no dia 8 de julho de 2010 por se tratar de uma manifestação absurda do machismo que atinge diariamente as mulheres.

O preconceito expresso na nota é fruto do estranhamento que ainda há, por parte de alguns, à presença das mulheres nos espaços da política e da disputa de poder. É como se isso não pertencesse as mulheres e como se não tivessem direito à participação política, exatamente como séculos atrás. É como se a pena para essa desobediência fosse a desqualificação moral, os ataques pessoais e a violência. É como se o tempo todo estivessem dizendo: a política não lugar das mulheres.

É comum que mulheres na política sejam ofendidas e desqualificadas a partir de elementos da sua vida pessoal - com uma rigorosa observação em relação ao seu estado civil, sua sexualidade e sua dedicação ao trabalho doméstico -; ou com adjetivos que em nada podem adjetivar sua atuação política. Esse constrangimento imposto às mulheres tem o objetivo nítido de restringir sua presença no “masculino” espaço público.

O chargista e o blogueiro utilizam-se do machismo para desqualificar o comportamento político da candidata Dilma Roussef, por isso colocam-se entre aqueles que consideram intolerável a presença das mulheres nos espaços públicos.

Pela sua história de luta contra qualquer forma de discriminação, a Diretoria de Mulheres da UNE condena a charge e sua publicação, esperando que a campanha eleitoral não seja marcada pelo derespeito a inúmeras brasileiras que ousaram desafiar neste ano de 2010 o machismo presente na política.

Diretoria de Mulheres da UNE

quinta-feira, 8 de julho de 2010

COPA DO MUNDO E PROSTITUIÇÃO


O processo de preparação para a Copa do Mundo trouxe para a África do Sul o debate da descriminalização e regulamentação da indústria do sexo. O país sede do mundial esperava receber neste período cerca de 40 mil prostitutas dentre meio milhão de visitantes que devem passar pela copa até o final.
Na Alemanha, em 2006, não foi diferente, com a industria do sexo legalizada desde 2002, o país se preparou para a copa com a construção de estádios, hotéis e luxuosas casas de prostituição, acreditando os investidores que futebol e sexo caminham juntos.
O projeto de lei que previa esta regulamentação da prostituição na África do Sul não foi adiante. Porém, nos argumentos das entidades defensoras desta causa, estão a forte discriminação sofrida pelas prostitutas no país, uma vez que, com a ilegalidade da prostituição, esta mulheres não podem contar com o apoio de nenhuma instituição pública, seja a polícia, em caso de violência, ou o serviço de saúde, para prevenção e tratamento de DSTs, por exemplo.
O fato é que criminalizar as mulheres não é mesmo o caminho, muito pelo contrário, elas precisam de todo um suporte do Estados para garantia de uma vida digna, com distribuição de renda, acesso aos serviços públicos como saúde e educação e políticas públicas para construção de sua autonomia financeira.
Porém, não são as mulheres as verdadeiras beneficiadas com a prostituição. Tais medidas visam claramente a defesa sanitária dos usuários deste “serviço”, dado os altos índices de HIV na África do Sul.
Além disso, precisamos considerar que a prostituição se torna uma atividade cada vez mais rentável para os capitalistas, esta regulamentação tem como efeito estimular o crescimento da indústria do sexo. Segundo o Parlamento Europeu, a indústria sexual ilegal realiza, por ano, mais dinheiro do que todos os orçamentos militares do mundo juntos (5 a 7 mil milhões de dólares) e cerca de 4 milhões de indivíduos, principalmente jovens mulheres, são anualmente transportadas dentro de um mesmo país e entre países com o objetivo de serem exploradas sexualmente.
Mulheres oriundas de países subdesenvolvidos são as maiores vítimas desta exploração. Vivendo em situação de pobreza absoluta, com baixa escolaridade, empregos precários, elas tornam-se presas fáceis para os aliciadores e acabam encontrando na prostituição uma alternativa para escapar da miséria a que estão submetidas. É a manutenção das pessoas na miséria que garante o fornecimento de meninas para o mercado do sexo. Por este motivo, a prostituição não pode ser encarada como uma opção individual das mulheres, sem considerar as condições de vida que a elas foram oferecidas.
A próxima copa do mundo será no Brasil, o debate da regulamentação da prostituição já é ventilado por algumas entidades da sociedade civil, setores do governo e do parlamento.
O fato é que a Copa do Mundo está diretamente atrelada ao turismo sexual, atividade que tem raízes principalmente na relação entre turismo e populações carentes, já que vivemos em um modelo econômico perverso e injusto, que visa exclusivamente o lucro de poucos e não se importa com a vida das mulheres. Por isso, precisamos ficar atentas para não deixarmos que a pressão dos investidores fortaleça uma posição favorável à legalização da indústria do sexo no Brasil.
Verônica Maia - Militante da Marcha Mundial das Mulheres/CE